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Foto do escritorJuliana Puggina

Dor nas pernas para andar: saiba tudo sobre doença arterial periférica

Atualizado: 18 de abr. de 2020


Dor nas pernas para andar pode ser sinal de obstrução das artérias

A dor nas pernas para caminhar pode ser indício de obstrução das artérias das pernas. Geralmente, este problema acomete pessoas acima de 50 anos e acontece devido a deposição de placas de gordura e cálcio nas artérias: a temida aterosclerose. Nesse artigo vamos tratar exclusivamente desse problema.


Aterosclerose: a origem do problema


A aterosclerose é uma doença silenciosa. Ela não causa dor ou qualquer sintoma na pessoa que a possui. Somente quando a placa de gordura e cálcio aumenta muito a ponto de causar um entupimento de alguma artéria é que os sintomas começam a aparecer. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2011, as duas principais causas de morte no mundo são relacionadas à aterosclerose: infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral (derrame). Essas duas doenças juntas corresponderam a 24,3% de todas as mortes registradas no mundo em 2011 (leia mais aqui). Em outras palavras: um quarto das pessoas que morreram em 2011, morreram por causa da aterosclerose. Esse dado é muito chocante.

Já falei um pouco sobre esse tema nos artigos: 'Problemas de circulação: como saber se tenho ou não!' e 'Dor nas pernas e suas causas'.


Quando a aterosclerose acomete as artérias que irrigam as pernas, o caso não é tão grave quanto quando acomete o coração ou as as artérias do pescoço e cérebro (que podem matar) porém, pode causar incapacidade para andar e até amputação da perna.

Os fatores responsáveis pelo desenvolvimento da aterosclerose são relacionados ao nosso estilo de vida, especialmente com a má alimentação, a falta de exercícios físicos, a obesidade e o tabagismo. Além disso, doenças crônicas como o diabetes e a hipertensão arterial também contribuem para a formação de placas de gordura nas artérias quando não são tratadas de forma adequada.

O acúmulo de gordura nas suas paredes leva ao entupimento das artérias

A formação das placas de aterosclerose dentro das artérias começa com a agressão da camada de dentro do vaso sangüíneo: o endotélio. Essa agressão é causada pelas toxinas presentes no cigarro ou pela pressão sangüínea muito alta ou pela alta concentração de glicose no sangue que ocorre no paciente diabético. Quando o endotélio das artérias é agredido, fica mais fácil a entrada de partículas de gordura e de colesterol ruim (LDL). A gordura e o colesterol ficam presos na parede da artéria, levando a formação de placas de gordura. Isso ocorre no corpo todo, em todas as artérias.


Para se defender, o organismo forma camadas de fibrose e de cálcio por cima dessa gordura. Se a pessoa mantiver os fatores de risco, cada vez mais gordura se acumula e em um determinado momento, ocorre a obstrução da artéria.


Além disso, mesmo quando a placa de gordura ainda não obstruiu totalmente o vaso, pode acontecer sua ruptura, liberando um fragmento que vai viajar pela corrente sangüínea até ficar preso em algum vaso menor. Chamamos este fenômeno de ateroembolismo.


Quando uma artéria é obstruída, ela é incapaz de levar o sangue cheio de nutrientes e oxigênio para as células de uma determinada região. Sem sangue e sem nutrientes e oxigênio, as células morrem.


E é por isso que a obstrução das artérias do coração levam ao infarto, a obstrução das artérias do cérebro levam ao derrame (AVC) e a obstrução das artérias da perna levam à gangrena e amputação.


Quando essa obstrução ocorre devagar, o organismo se adapta lentamente, produzindo novos vasos que, apesar de menores, conseguem levar o sangue até as células. Isso é chamado de circulação colateral.


Obstrução das artérias das pernas e a dor para andar


Quando a aterosclerose acomete as artérias das pernas, o sangue tem dificuldade de chegar na musculatura que usamos para caminhar. Mas, como expliquei acima, aos poucos o organismo vai criando outros caminhos para o sangue atingir seu destino.


Sendo assim, existem muitas pessoas com obstrução completa da circulação arterial para uma ou até para as duas pernas que não sentem absolutamente nada. Nesses casos, a circulação colateral é suficiente para manter as células musculares vivas e funcionando de forma adequada.


Porém, algumas vezes, o sangue que chega e suficiente para manter as células vivas mas, quando há uma exigência maior, como caminhar, o sangue já não é suficiente.

Quando falta oxigênio, as células musculares utilizam um recurso chamado respiração anaeróbia para produzir a energia necessária para movimentar o músculo. Nessa modalidade do metabolismo celular, o oxigênio não é necessário, porém ocorre a produção de substâncias tóxicas como o ácido lático.

A claudicação intermitente, ou dor para caminhar, é conseqüência da obstrução das artérias das pernas

O ácido lático em contato com as terminações nervosas da musculatura gera DOR.


Sendo assim, quando a pessoa que tem obstrução arterial anda, ela sente dor. Essa dor piora se a pessoa continuar andando, até o ponto que a obriga a parar para descansar. Após alguns minutos de descanso, a dor melhora e a pessoa é capaz de voltar a andar.... até o momento que a dor retorna.

Devido a esse comportamento de andar, parar e andar de novo, os médicos denominaram este sintoma de Claudicação Intermitente.


Esse é o primeiro estágio da doença arterial obstrutiva periférica crônica.


Se a pessoa não se cuidar, continuar fumando, continuar comendo mal, continuar sem fazer exercício físico, não tratar o diabetes, a pressão alta e o colesterol alto, as artérias vão obstruindo uma a uma, até o ponto que o sangue não será mais suficiente para manter o metabolismo normal das células mesmo no repouso. Nessa situação, a dor passa a acontecer mesmo quando a pessoa está parada.


Nesses casos, a situação pode piorar ainda mais, ocorrendo a morte das células. E é isso que leva ao aparecimento de feridas e da gangrena.

A gangrena ocorre pela obstrução das artérias
Gangrena em dedo do pé

Como prevenir a aterosclerose e a obstrução das artérias?


As principais medidas para evitar o problema são:


- Alimentação balanceada: pobre em gorduras, colesterol e alimentos industrializados e rica em frutas, verduras, legumes, cereais integrais e carnes magras. (Saiba mais sobre alimentação adequada no post 'Alimentação e problemas da circulação: o que comer para manter a saúde vascular')


- Prática de exercícios físicos: o exercício físico diminui os níveis de colesterol, diminui a pressão arterial, diminui o aparecimento do diabetes e estimula o aparecimento de novos vasos sanguíneos que compõem a circulação colateral. O recomendado é realizar atividades físicas por 30 minutos, no mínimo 3 vezes por semana.


- Parar de fumar: as substâncias presentes no cigarro agridem o endotélio das artérias, aumentando a deposição de gordura. (aprenda dicas para parar de fumar no post "Eu quero parar de fumar, o que devo fazer?")


- Emagrecer: a obesidade, especialmente a obesidade abdominal, é um fator de risco para a aterosclerose.


- Tratar corretamente de doenças crônicas como o Diabetes Mellitus, a Hipertensão arterial e a Hiperlipidemia (colesterol alto) : é imprescindível o acompanhamento médico, com exames frequentes, ajuste de medicações e modificação dos hábitos de vida. Nada de medir pressão ou glicemia na farmácia e achar que isso é suficiente.


E quando a doença já está instalada, o que dá para fazer?


Se você já tem doença arterial obstrutiva crônica e dores para caminhar ainda dá para correr atrás do prejuízo. Infelizmente, as artérias que estão obstruídas não voltarão a ficar pérvias. Nenhum medicamento, exercício ou mudança de hábito é capaz de fazer isso.


A caminhada é fundamental no tratamento da doença arterial obstrutiva crônica

Porém, se você seguir as orientações que eu falei no item anterior, a chance de a dor para caminhar melhorar e a doença estacionar são muito boas. O consenso médico internacional sobre a doença mostra que 80% dos pacientes mantém a doença estável se modificarem os hábitos de vida após 5 anos de acompanhamento (leia mais aqui). Esses pacientes melhoraram da dor ou mantiveram dor estável e não precisaram realizar nenhuma cirurgia, muito menos uma amputação.


Mas, em 20% dos casos, mesmo fazendo tudo certinho, a doença progrediu, piorando a ponto de causar  piora na qualidade de vida, dor em repouso, feridas e gangrena.

Quando isso ocorre é necessário avaliar as artérias doentes com exames detalhados, como a angiotomografia, a angioressonância magnética ou a arteriografia. Esses exames detectam exatamente onde se encontra e como é a obstrução das artérias e com esse dado, o médico cirurgião vascular é capaz de planejar a cirurgia necessária.


Quando temos uma obstrução arterial há duas formas de resolver o problema do ponto de vista cirúrgico: desobstruir o vaso através da angioplastia (com ou sem colocação de stent) ou pular a obstrução através de uma ponte ou enxerto, que pode ser feito com veia safena ou com próteses artificiais.


A angioplastia é uma alternativa para o tratamento da doença arterial obstrutiva crônica das pernas
Angioplastia com balão

A angioplastia é uma cirurgia feita sem cortes. O médico acessa as artérias através de uma punção como uma agulha grossa e chega até a obstrução através de fios guia e cateteres, navegando no interior dos vasos guiado por imagens de raio-x. Quando chega na área afetada, ele insufla um balão que vai abrir espaço para o sangue passar. Algumas vezes, é necessário colocar uma estrutura de metal maleável, o stent, para manter este espaço aberto. Essa técnica tem ótimos resultados porém não pode ser realizada em todos os casos.


Nos casos em que não é possível permear novamente as artérias com a angioplastia é necessário realizar uma cirurgia maior e mais demorada, em que o cirurgião vascular irá criar um novo caminho para o sangue passar e atingir a área que está carente de oxigênio e nutrientes. Essa cirurgia é chamada de enxerto arterial ou ponte. Essa "ponte" na maioria das vezes é feita com veia safena, que é uma veia superficial que temos na perna, e pode ser retirada sem grandes prejuízos ao corpo. Algumas vezes, o cirurgião prefere utilizar próteses no lugar da veia.


O risco dessas cirurgias é piorar a circulação e levar a amputação do membro, isso vale tanto para a angioplastia quanto para o enxerto arterial. Mesmo quando a cirurgia é realizada da melhor forma e não se comete nenhum erro, isso pode acontecer. É um risco inerente da cirurgia. Por isso que reservamos o tratamento cirúrgico para os casos mais graves, nos quais o tratamento com medicamentos e mudança de hábitos não resolveu e a qualidade de vida do paciente está comprometida pela doença.


Concluindo, a dor nas pernas para caminhar pode ser o indício de uma doença muito séria que pode matar e causar amputação dos membros: a aterosclerose. A aterosclerose é a principal vilã da vida moderna, causada pelos nossos hábitos de vida ruins. Para evitá-la ou diminuir sua progressão é necessário mudar os hábitos: alimentar-se melhor, realizar exercícios físicos, não fumar e tratar das doenças que pioram o problema. O paciente que tem dores nas pernas para caminhar e inicia o tratamento correto, incluindo a mudança dos hábitos, na maioria das vezes melhora da dor e nunca irá precisar de uma cirurgia. Mas se o problema progredir, pode ser necessário realizar a revascularização da perna, através da angioplastia ou do enxerto arterial (ponte de safena). Às vezes, quando nem a cirurgia resolve o problema, a amputação de uma parte ou de toda a perna é inevitável. Para evitar esse desfecho, os portadores de aterosclerose e obstrução arterial precisam de acompanhamento de perto de um cirurgião vascular!

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Sobre a autora

Dra. Juliana Puggina é médica cirurgiã vascular e escreve artigos informativos no blog 'Pernas pra que te quero'. Formada em Medicina pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), com residência médica em Cirurgia Vascular pela Universidade de São Paulo (USP). Membro da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular e do American College of Phlebology. Atende em São Paulo/SP.


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