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Nova recomendação sobre tratamento de trombose: o que mudou?

Atualizado: 18 de abr. de 2020


A trombose venosa profunda é um problema que afeta milhões de pessoas. Confira as mudanças no seu tratamento

Em 1986, o Colégio Americano de Médicos e Cirurgiões Torácicos (American College of Chest Physicians) publicou em seu Jornal Científico, o “Chest Journal”, o primeiro guia sobre o tratamento e prevenção de trombose venosa e tromboembolismo pulmonar. Esse guia ficou popularmente conhecido no meio médico simplesmente como “Chest”, e vem sendo utilizado desde então por médicos de todo o mundo para guiar as suas condutas em relação à essa doença.

No mês passado, janeiro de 2016, foi publicada a 10a edição desse guideline e algumas coisas mudaram! Então resolvi escrever para contar essas mudanças para vocês.


O CHEST é o guia sobre tratamento da trombose que foi publicado em janeiro de 2016

A primeira pergunta que me fiz quando li pela primeira vez esse guia (foi em 2012, quando saiu a 9a edição) foi a seguinte: por que raios são os médicos do tórax que escrevem sobre trombose venosa? Não deveriam ser os cirurgiões vasculares, angiologistas, hematologistas etc. que deveriam ser os ditadores da conduta sobre esse assunto?? Enfim, não sei o motivo exato porque isso aconteceu, mas como os médicos pneumologistas e torácicos estão habituados a tratar casos dramáticos de tromboembolismo pulmonar (TEP), que podem inclusive resultar em morte, acho que eles acabaram se interessando mais em definir como isso poderia ser tratado antes que o TEP acontecesse.


Para quem não lembra o que é o tromboembolismo pulmonar, trata-se daquela situação em que o indivíduo tem uma trombose venosa profunda, geralmente nas pernas, e o coágulo de sangue que está entupindo a veia da perna e causando a trombose se solta e viaja pela corrente sanguínea até o pulmão, onde fica preso nos pequenos vasos pulmonares, levando a falta de sangue e morte do trecho de pulmão afetado. Expliquei com mais detalhes como isso acontece no post “ Trombose venosa profunda: saiba como prevenir e tratar este problema”.


Voltando ao novo Chest, são 54 recomendações, das quais 12 foram modificadas e 3 foram adicionadas nessa nova edição. Além disso, o novo guideline está bem mais claro e fácil de ler do que a edição anterior de 2012. Quem quiser ler o texto na íntegra em inglês clique aqui .


A principal mudança no novo guideline é com relação às mais novas evidências científicas sobre a eficácia dos anticoagulantes orais não inibidores de vitamina k (antigamente nós os chamávamos de novos anticoagulantes, mas agora eles não estão mais tão “novos” assim... me senti um pouco velha agora). No guideline anterior, ainda não se sabia ao certo se estes medicamentos eram melhores do que a boa e velha varfarina (falei sobre ela no post “O que a pessoa que está tomando anticoagulante não pode comer? Saiba tudo sobre os alimentos com vitamina K”), mas hoje vários estudos demostraram superioridade desses medicamentos, especialmente no que diz respeito ao quesito segurança e adesão do paciente ao tratamento.


O xarelto e os outros anticoagulantes orais não inibidores da vitamina k são os principais medicamentos para tratamento da trombose

Para pacientes que tenham câncer e desenvolveram uma trombose venosa, o guideline manteve a recomendação de tratamento com heparina injetável subcutânea(heparina de baixo peso molecular), porém adicionou a informação que a medicação injetável deve ser preferida em relação aos comprimidos tomados por via oral, inclusive os anticoagulantes orais não inibidores da vitamina K. Isso se manteve porque ainda não foram publicados estudos suficientes para saber se esses novos anticoagulantes orais são tão seguros e eficazes nos pacientes com câncer. Esses estudos estão em andamento no momento e devem ser publicados em breve. A justificativa para o tratamento da trombose com injeção de heparina de baixo peso molecular se baseia num estudo chamado CLOT publicado em 2003 no The New England Journal of Medicine (leia mais aqui), em que os pacientes que usaram injeção de dalteparina por 6 meses tiveram redução de 50% do risco de nova trombose em relação aos que tomaram varfarina pelo mesmo período.


Outra estudo importante envolveu 900 pacientes com câncer e trombose venosa comparando o tratamento de outra heparina injetável subcutânea (tinzaparina) e a varfarina (leia mais aqui). Esse estudo mostrou que o tratamento com a heparina injetável foi igualmente efetivo ao tratamento com varfarina, porém não modificou o risco de morte ou de sangramento nesses pacientes. Sendo assim, o novo guideline recomenda que os pacientes que tenham câncer ativo e desenvolvam uma trombose, utilizem as injeções de heparina ao invés do medicamento por via oral. (parágrafo melhorado graças à ajuda do amigo e fera em trombose Dr. Eduardo Ramacciotti)


Uma mudança que gostei muito no novo Chest foi a clareza na definição do tempo de tratamento da trombose. Na edição anterior, não ficava muito claro se o tratamento deveria ser realizado por 3, 6 ou 12 meses. Agora está claro: o tratamento por 3 meses é o mais indicado (com grau de recomendação 1B para os que entendem de Guidelines Médicos), especialmente nos casos de trombose provocada por algum fator de risco como cirurgia recente, imobilização da perna, gestação, após o parto etc. Nos pacientes em que a trombose apareceu do nada, sem ter nenhum fator de risco evidente, vale a pena investigar as doenças do sangue que levam a trombose (trombofilias) e avaliar o risco de sangramento. Se o risco de sangramento for baixo, vale a pena deixar o remédio anticoagulante para o resto da vida!


Outra coisa nova que apareceu nessa edição foi a recomendação do uso diário do ácido acetil salicílico (AAS ou aspirina) para prevenção de uma nova trombose nos pacientes que tiverem o tratamento de anticoagulação suspensa. Estudos científicos mostraram que o AAS reduz o risco de uma nova trombose venosa em um terço. Em outras palavras: se você terminou seu tratamento de trombose com um anticoagulante (seja heparina, varfarina ou outro anticoagulante oral, como xarelto, por exemplo) você deve manter o tratamento preventivo com AAS diário para evitar que a trombose volte.


O novo CHEST não recomenda o uso de meias elásticas para prevenir o aparecimento da síndrome pós trombótica

Agora vem a parte que eu não gostei: o novo guideline não recomenda que o uso da meia elástica seja indicado para os pacientes com trombose no intuito de prevenir a síndrome pós-trombótica (falei sobre isso nesse post aqui: “Úlcera varicosa: por que aparece e como se ver livre dela”) Fiquei um pouco desapontada porque, na minha experiência, a meia ajuda sim e muito a prevenir as complicações da trombose como o inchaço, a dermatite ocre e até as úlceras varicosas. O guideline de 2012 também recomendava o uso de meias elásticas de compressão por 2 anos após a ocorrência da trombose. Porém, em 2014 foi publicado na revista Lancet, um estudo grande (multicêntrico, randomizado, placebo-controlado) com 806 pacientes com trombose seguidos por 2 anos, não mostrou diferença no aparecimento das complicações da trombose. (quem quiser ler o texto completo, pode acessar este link aqui). Vamos aguardar os novos estudos para saber se isso vai se confirmar.


Outra mudança que foi bastante interessante na minha opinião, foi que, mesmo os pacientes que tiverem tromboembolismo pulmonar, quando este for pequeno e o paciente estiver com poucos ou nenhum sintoma (como aqueles em que aprecem apenas nos exames), podem ser tratados em casa, sem necessidade de internação hospitalar. Claro que, para poder ir para casa, o paciente tem que estar respirando bem, não pode ter doenças cardiopulmonares ou outras doenças graves, não pode ser muito idoso ou debilitado, tem que ser bem orientado para o uso correto da medicação e tem que morar numa casa que tenha condições de recebe-lo, caso contrário, deve permanecer no hospital.

Existem outras mudanças na nova edição do Chest mas são bastante técnicas e desinteressantes para o público em geral, então acabei não as colocando neste texto para não cansar a beleza de vocês.


Resumindo, o tratamento da trombose venosa hoje deve ser realizado da seguinte maneira (segundo as novas recomendações do guideline):


- Em pessoas com trombose venosa causada por algum fator de risco (como cirurgia, imobilização, gestação e pós parto etc,) deve ser realizado tratamento com os anticoagulantes orais não inibidores da vitamina K – dabigatrana (Pradaxa®), rivaroxabana (Xarelto®), apixabana (Eliquis®) e edoxabana (Lixiana®) por 3 meses.


- Em pessoas com trombose espontânea (sem nenhum fator de risco conhecido) o tratamento deve ser feito da mesma forma. Ao final dos 3 meses, deve-se avaliar o risco de sangramento versus o risco de ter uma nova trombose para saber se vale a pena a pessoa tomar o remédio para o resto da vida.


- As pessoas que tenham trombose que foi causada por um câncer devem ser tratadas com as heparinas injetáveis subcutâneas (heparinas de baixo peso molecular) – enoxaparina (Clexane®, Versa®, Endocris®, Heptron®, Cutenox®, Enoxalow®), nadroparina (Fraxiparina®), dalteparina (Fragmin®) tinzaparina (Innohep®) ao invés dos anticoagulantes orais como a varfarina (Marevan®, Coumadin®) e Pradaxa® ou Xarelto® ou Eliquis® ou Lixiana®. O tratamento dessas pessoas deve ser estendido até pelo menos a resolução do câncer.


- As pessoas que tiveram o segundo episódio de trombose na vida e tiverem baixo ou moderado risco para sangramentos, devem ser tratadas com anticoagulantes pelo resto da vida, para evitar uma nova trombose.


- As pessoas que já tiveram trombose e já pararam de tomar os anticoagulantes, devem tomar AAS para prevenir o aparecimento de uma nova trombose.


- O tratamento da trombose pode ser feito em casa desde o início, desde que a pessoa esteja em boas condições de saúde e tenha condições de seguir o tratamento de forma adequada. Casos mais graves devem ser tratados internados em hospital.


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juliana puggina médica vascular são paulo varizes

Sobre a autora


Dra. Juliana Puggina é médica cirurgiã vascular e escreve artigos informativos no blog 'Pernas pra que te quero'. Formada em Medicina pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), com residência médica em Cirurgia Vascular e Endovascular pela Universidade de São Paulo (USP). Membro da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular e do American College of Phlebology.


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